terça-feira, 22 de novembro de 2011

''Ficha Limpa será o desafio de 2012''

A eleição de 2012 servirá de grande teste para a Lei da Ficha Limpa. A avaliação é do procurador federal Antônio Edílio Magalhães Teixeira, 41 anos, que a partir desta segunda-feira assume a Procuradoria Regional Eleitoral

Do JC Online

JORNAL DO COMMERCIO – Na última eleição, em 2010, houve um grande debate jurídico em torno da aplicação da Lei da Ficha Limpa. Qual será o grande debate das próximas eleições?
ANTÔNIO EDÍLIO 
– Na verdade, o desafio da Ficha Limpa será exatamente em 2012. É a primeira vez que a Lei Complementar 135 (Lei da Ficha Limpa) vai ser testada em termos de amplitude e efetividade. Embora se tenha discutido muito, a lei não foi aplicada; será aplicada agora. E como as eleições são municipais, ainda há um detalhe: haverá muito mais candidatos para o Executivo, o que envolve muito mais pessoas que já passaram pelo Executivo. Então haverá muito mais material fático para discussão com base na lei. Uma questão importante é que essa lei é de 2010, e há quem diga que fatos ocorridos antes de 2010 não seriam abrangidos pela lei – seria uma forma de retroagir para punir coisas passadas. Eu compreendo de forma diversa: a lei é plenamente aplicável para as eleições do ano que vem...

JC – Independentemente se uma improbidade ocorreu antes da sua publicação...
EDÍLIO –
 Se anterior ou posterior. Por que essa lei não estabelece penalidades, mas condições para ser candidato. A partir do momento que ela estabelece condições, dali por diante elas são válidas. No momento do registro da candidatura, (o candidato) tem ou não tem aquelas condições? (...) Quando a lei estabelece uma condição para o exercício do cargo, o que importa é que essas condições sejam exigidas no momento posterior à lei. Tenho a impressão que o Supremo (Tribunal Federal, STF) vai enfrentar essa questão antes das eleições de 2012, até para dar mais estabilidade e segurança.


JC – Qual a sua expectativa para esse julgamento?
EDÍLIO 
– É que (a Ficha Limpa) se aplique plenamente, e há precedentes. A Lei Complementar 64/1990 (Lei das Inelegibilidades) estabeleceu um monte de condições para ser candidato. Havia condições ocorridas antes de 1990 e o STF concluiu que a lei pode estabelecer condições para se ingressar num cargo público: a partir da publicação da lei, as condições são aquelas e que o interessado tem de preencher.

JC – Existem defensores da tese de que, dentro do rol da improbidade administrativa, há casos que não seriam atingidos pela Lei da Ficha Limpa. Casos, por exemplo, onde houve desvio de finalidade na aplicação do recurso, mas não ocorreu o desvio de dinheiro. O senhor entende que existe uma graduação nos casos de improbidade para aplicação da Lei da Ficha Limpa?
EDÍLIO 
– Existe uma graduação, mas para toda improbidade há uma punição. Existe a improbidade que fere tão somente os princípios da administração, mas sem dano ao erário; existe aquela que causa dano ao erário, que seria um segundo grau; e existe a que causa dano ao erário e uma vantagem pessoal, que está num terceiro grau. Mas toda ela é improbidade. Agora, no (processo) eleitoral não se vai discutir isso. Por que a lei diz que é inelegível quem foi condenado por órgão (judicial) colegiado em ação de improbidade. Não cabe mais à Justiça Eleitoral, na minha visão, avaliar se a improbidade é grande ou pequena. Onde é que se faz essa graduação? Em caso de condenações por Tribunais de Contas. Já há um certo entendimento de se fazer essa graduação. É a história da desaprovação das contas: toda a desaprovação de contas gera inelegibilidade? A Justiça Eleitoral vem fazendo um juízo de valoração a respeito. Não um juízo de valor profundo, mas superficial.

JC – Como o senhor, então, valora o julgamento dos Tribunais de Contas?
EDÍLIO
 – Existem dois tipos de avaliações de contas: as de contas específicas e das contas anuais. Nas anuais, onde se faz uma avaliação geral, quem julga são as Câmaras de Vereadores e as Assembleias (Legislativas) – o Tribunal de Contas emite parecer. Agora, nas questões específicas, envolvendo convênios e programas (auditorias especiais), quem julga é o Tribunal de Contas, não depende de Câmara de Vereadores. Essa Lei Complementar 135 trouxe um fator duvidoso, dando a entender que mesmo nessas contas anuais, que precisam de julgamento das Câmaras de Vereadores, seria possível apenas a deliberação dos Tribunais de Contas para gerar inelegibilidade. Essa é uma questão que precisa ser melhor estudada. Mas uma coisa é certa: sendo contas específicas, basta (a decisão) o Tribunal de Contas. Então, qualquer decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) gera inelegibilidade, porque ele só trabalha com convênios específicos. (...) A Lei da Ficha Limpa dá abertura para uma interpretação mais ampla. Por isso, estamos criando um fórum permanente de discussão virtual com os promotores (eleitorais) do Estado e vamos ter reuniões presenciais mensais para que, esses pontos mais sensíveis, todos eles, vão ser discutidos para a gente ter uma certa coerência, poder exercer uma certa firmeza e, ao mesmo tempo, atuar com mais reflexão nessas questões. Por que a atuação do Ministério Público Eleitoral tem um certo poder de estrago. Vamos tentar evitar medidas mais precipitadas.

JC – O fato de as Câmaras de Vereadores aprovarem contas do prefeito quando o Tribunal de Contas recomenda a rejeição, não colocaria a Lei da Ficha Limpa em descrédito? Não há forma, nesses casos, de enquadrar o gestor na Lei da Ficha Limpa?
EDÍLIO 
– A gente não pode ficar inventando coisas. A lei estabeleceu os parâmetros: as contas anuais os Tribunais de Contas emitem parecer e as Câmaras aprovam ou desaprovam. A gente sabe que, muitas vezes, as coisas funcionam ao sabor das composições políticas e não tecnicamente. (...) Mas quanto às contas anuais (se aprovadas pelo Legislativo) não tem o que fazer.

JC – Como vai funcionar essa sua tentativa de se criar um entendimento homogêneo entre os promotores eleitorais sobre alguns temas?
EDÍLIO 
– Tenho uma reunião na terça-feira (8/11) com o procurador-geral de Justiça (Aguinaldo Fenelon) para ver como a gente pode fazer. A minha ideia é, todo mês, na primeira segunda-feira do mês, ter uma reunião aqui na Procuradoria (Eleitoral) com os promotores.

JC – Além da Ficha Limpa, que outros assuntos o senhor tem em mente e que merecerão uma atenção maior do Ministério Público?
EDÍLIO
 – Propaganda antecipada é um assunto do dia: já tem propaganda antecipada na rua. Precisamos discutir isso imediatamente. Precisamos discutir o uso da máquina administrativa. Em eleições municipais, o risco do uso da máquina administrativa é considerável.

JC – De que forma o senhor já vê manifestada a propaganda antecipada nas ruas?
EDÍLIO
 – Vejo outdoors, adesivos em carros. Embora não sejam tão diretos, mas é propaganda. Outdoor serve para quê? É um artefato tipicamente para propaganda. A questão é: trata-se de propaganda eleitoral? Há quem diga, é só uma promoção pessoal. Mas promoção pessoal visando o quê? Ninguém faz promoção pessoal só pelo prazer de se olhar num outdoor. Se a finalidade é eleitoral, na minha visão, é importante que o Ministério Público Eleitoral tome providências. E na minha função de dirigir o MPE, vou estar em contato com os promotores para tomar as providências.

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